segunda-feira, 4 de abril de 2011

Mário Soares: "Descontentamento pode levar à desagregação da UE"



O descontentamento que reina na Europa face aos Governos nacionais e ás instituições europeias, num continente "dominado pela Alemanha de Merkel", pode levar à decadência e possível desagregação da UE, afirma Mário Soares.

"Se a Europa não percebe o descontentamento que reina em todo o lado, contra os Governos nacionais e as instituições europeias e a distância que os separa dos seus povos, é indubitável que nos encaminhamos para a decadência da UE, num mundo em transformação, e para a sua possível desagregação", escreve num artigo publicado hoje no El Pais.

Mário Soares considera que "a igualdade e a solidariedade entre os estados desapareceu" com todos "mais ou menos dominados pela Alemanha da chanceler Merkel", que "se esqueceu do que a Alemanha deve à Comunidade Europeia".

Considerando-se "dona da Europa" e "apoiada pelo seu servil aliado, o presidente Sarkozy" leva a que a economia e as finanças dominem tudo, com o BCE e os bancos alemães, "ainda que não exclusivamente", a "paralisar uma Europa de cidadãos, uma Europa política, de tipo federal".

No artigo, intitulado "Portugal e Espanha no contexto europeu", o ex-presidente da República recorda que apenas três países são governados por Governos socialistas (demissionário no caso português) e que todos são do sul, com um peso "mais marcado pela história e pelo que representam" do que pelo dinheiro.

"Não são coisas de pouca monta mas, claro, os economistas como só vêm o dinheiro, esquecem-se o resto. E talvez por isso se enganem tantas vezes", escreve.

"Os três Estados (Grécia, Espanha e Portugal) poderiam ter-se oposto às exigências de uma Alemanha que os lançava para uma recessão inaceitável. Mas não tiveram coragem para o fazer", sublinha.

Afirmando que as instituições europeias continuam "sem compreender bem" a crise económica, Soares sustenta que "o neoliberalismo, como ideologia, está esgotado, como aconteceu há 20 anos com o comunismo". E, por não reconhecem isso, não notam que "além da redução do défice é necessário procurar reduzir o desemprego, as tremendas desigualdades sociais" e "procurar um novo paradigma de desenvolvimento". Se esses problemas não se resolvem, considera Soares, "a crise conduzirá a ruturas que podem ser violentas e perigosas".


Notícia publicada no Diário de Notícias, de hoje.

Artigo de Mário Soares publicado no El Pais, de hoje.